Sono e acidentes rodoviários

Pelo pneumologista Carlos Figueiredo.

Pneumologista no Hospital de Santa Marta (Unidade Local de Saúde São José), Clínica Sleeplab e Consultório Vaz Pereira; Membro da ESRS.

Em Portugal, segundo dados da PSP e GNR, no ano de 2023 ocorreram 123.391 acidentes rodoviários, 442 vítimas mortais, 2279 feridos graves e 38.548 feridos ligeiros. Quantos destes acidentes poderão ter sido causados pelo sono (ou, melhor dizendo, pela falta dele)? Se extrapolarmos com base em literatura internacional (American National Sleep Foundation), será expectável que cerca de 20% dos acidentes sejam neste contexto, ou seja, cerca de 24.700 acidentes por ano.

Dentro de todas as implicações de um sono afetado (tanto quantitativamente, com diminuição do seu tempo, como qualitativamente, com diminuição da sua qualidade e adequada estrutura), encontram-se as alterações cognitivas. Efetivamente poderá dizer-se que são estas alterações que afetam mais diretamente o dia-a-dia do indivíduo como ser social, como indivíduo numa sociedade. Sublinho o problema na atenção, concentração, latência de resposta/tempo de reação, julgamento, decisão, ação e coordenação.

Todos estes problemas afetam a capacidade mental e motora de cumprir tarefas, sendo que em situações concretas dependentes do indivíduo, como é o caso da condução, acarretam um risco de acidente. Neste contexto, além do risco de saúde para o próprio, na maioria das vezes acresce ainda o risco para terceiros.

Também no contexto laboral este tema é relevante, sendo que existem varias profissões em que a as máquinas são mobilizadas pelo indivíduo, com os mesmos riscos supracitados.

Numa perspetiva futurista de facto podemos considerar que este problema poderá ser controlado pela inteligência artiticial/tecnologia que permita que a condução se torne um ato automático e independente do utilizador. Mas, para já, a condução depende ainda e muito do condutor humano.

Imagem: Unsplash, Worshae

Felizmente existe solução: a prevenção. Sem dúvida que a prevenção é a melhor e mais eficaz ferramenta. Em termos de prevenção primária, devemos reduzir ao máximo a probabilidade de sonolência/diminuição da capacidade cognitiva, antes da condução, através de medidas como:
🚘 Promoção das medidas de higiene de sono
🚘 Evitar a privação de sono
🚘 Planear as viagens
🚘 Tratar (com boa adesão) patologias do sono, entre outras.


Mas também através de prevenção secundária, sinalizando precocemente sinais de sonolência (alguns automóveis já o começam a sinalizar também) e reagindo a estes sinais com medidas, como:
🚙 Parar logo que possível e dormir uma sesta
🚙 Reconsiderar e antecipar a estadia seguinte para cumprir o período de sono em falta
🚙 Tomar bebidas estimulantes como a toma de café ou outras (apesar de poderem dar uma falsa sensação de segurança e terem uma eficácia heterogénea).

Existindo assim medidas práticas que podem ser instituídas e promovidas entre os vários stakeholders na sociedade. É o caso específico da criação de espaços para sesta em áreas de serviço. Mas também a literacia em saúde da população e da promoção do Sono como elemento essencial para todos.

Independentemente das medidas referidas, se tiver problemas de Sono, aconselha-se que procure ajuda especializada. A detecção e tratamento precoces são fundamentais para uma melhor eficácia.

Por isso: se conduzir, tenha um bom sono antes.

Para quando este slogan se tornará comum e repetido tal como é feito correctamente com o álcool.

Deixo a questão em aberto para que todos, como sociedade, possamos potencialmente ter uma voz ativa no combate contra a sinistralidade rodoviária.

Um site para quem nasceu a dormir, mas que nada sabe sobre sono.

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